E sexo? Você já fez? [+18]

censurado

Samuel era um cara relativamente tranquilo, teve uma vida normal, pais normais, educação normal, juventude normal. Nunca foi o primeiro da turma, nem o último. Não se dava bem com futebol, não tinha talento para tocar violão, não tomou pinguerante, não saía nos finais de semana, não desenhava, não tinha coragem pra tatuar, não curtia igreja e pra finalizar, não beijou na boca. Masturbação é outra história, que não convêm ao caso, por enquanto.

Sem muito esforço ingressou na faculdade, também sem muita empolgação começou a estagiar em uma repartição pública, foi jogado para o setor da informática, usava óculos, meio caladão, devia ser nerd. Pelo menos alguém iria garantir o download de Spartacus em 1080HD. A rotina era a mesma, trocar toner, passar antivírus e abrir power points com mensagens imprescindíveis para sobrevivência ao tédio da vida, esperar o quinto dia útil do mês seguinte.

Em uma dessas jornadas que consistia checar o vírus e a paciência (Da máquina e a dele mesmo) conheceu Raquel, os amigos do setor deram uma mãozinha e arrumaram um cinema para os dois. Deu certo, ela se adiantou e o beijou, segurou na mão dele na saída e deixou claro:

– Nós somos namorados agora, se eu pegar você olhando outra, lhe sento a mão!

Foi mais que isso, Raquel era divertida, bebia, ensaiava fumar maconha mas ficava só no cigarro de baile, adorava música alta, lugares lotados, sentia-se viva ouvindo o mundo e dançando ao mesmo tempo, Samuel só pensava em uma coisa: quando o sexo iria rolar.

Na sala da informática, o bullying rolava solto, recebeu nomes e ofensas gratuitas sobre ainda não ter transado com aquela esquisitinha que ficava na reprografia.

– Você precisa chegar nela, agarra-la, tirando lhe o ar. Disse o sedutor

– Que nada, quando for levar ela pra casa, passa em frente a um motel e deixa o carro morrer, diz que o jeito vai ser dormir lá. Adestrou o canalha

– Fala logo: Vamos transar? Orientou o sincero

Não tinha muita opção, apesar da pressão dos colegas, Samuel estava subindo pelas paredes toda vez que Raquel lhe beijava. Lhe faltava palavras , o ar, o norte, as pilhas, a decência e claro, a coragem. Bastava um abraço apertado para sentir o corpo em erupção, bastava um beijo perto da orelha e o mundo vinha ao chão, tava difícil segurar a onda. Raquel estimulou em uma semana o que Samuel não havia sentido por ninguém a vida inteira.

Num sábado anoite, casa vazia, convidou a gata para ver um filme. Acendeu incenso de Umbanda, fez uns sanduíches sem maionese e salada, só pão e hambúrguer, pra finalizar abriu a garrafa de vinho seco e serviu os dois, em um copo achou a coragem que nunca teve.

– Raquel, eu queria falar uma coisa com você.

– Diz logo, odeio suspense. Sobre o que é?

– Sobre sexo, você já fez?

– Não! Sou virgem.

– Mas você é toda descolada e tals…

– Mas continuo virgem e não vou te dar, na real, vou nessa.

Saiu fora. Samuel terminou a garrafa.

– Relacionamento é um troço complicado!

Dormiu vendo o filme.

O coleciona-dor

Thiago Maroca e sua coleção de moedas

Acordou e lembrou que não poderia ir tomar café na padaria até as 9h, correria um sério risco de encontrar com a Márcia já que hoje é quinta e ela acorda tarde devido ao jogo da noite passada. Fritou o último ovo que estava na geladeira com estampa de melancia, que inclusive, só comprou para provocar o Tobias e a Renata, casal de ex-amigos que tinham uma casa bem estilosa. Por vingança falou mal dos dois no Facebook e perdeu um casal que fazia maravilhosos pães.

Enquanto o ovo fritava,  olhou o Whatsapp e viu mais uma mensagem com texto do Dalai Lama no grupo da família, só estava no grupo por amor a mãe, que aliás era a única que ainda mantinha contato.

Sentiu que precisava ocupar seu tempo enquanto esperava a rua ficar vazia para não ser obrigado a cumprimentar pessoas indesejáveis. Imagina você, obrigado a acenar ao porteiro turco, o vizinho surdo, a mulher que vendia avon todos os dias? Uma terapia da qual não estava afim. Para disfarçar que não tinha visto a mulher-avon fingiu ler um cartaz no poste.

– Filatelia e numismática.

As palavras não saiam de sua cabeça, pesquisou no Wikipédia e leu que o primeiro era sobre coleções de selos e o outro sobre coleções de moedas, dinheiro em geral.

– Porra! Filatelia! Era isso!

Não era, isso é coisa pra quem tem grana, tem selo que custa 40 mil doláres, ninguém escreve carta neste país, uma coleção somente de carta social não podia ser coisa séria.

– Minha vó tem um pote cheio de moedas antigas.

E a resposta foi:

– Tire as mãos das minhas moedas  infeliz das costas oca. Vai guardar as suas seu pão duro.

A velha era um charme, mas não ia ceder nem com reza braba. O jeito seria começar a coleção do zero, iria começar pedindo pela internet mas lembrou que não tinha amigos nas redes sociais. Talvez o pessoal da igreja, mas odiava todo mundo de lá, exceto Jesus. Quem sabe o único amigo de verdade, o Tico.

– Me paga aqueles 300 reais que tu me deve, que te dou 5 reais em moeda pra essa tua coleção. Vá se lascar!

Não ia rolar, o jeito seria pensar em outra coleção ou continuar a que sempre teve em segredos, a coleção de inimizades.

 

Estamos em crise… de identidade

Thiago_maroca

Parece clichê falar de algo que já foi discutido em festa de aniversário, ponto de ônibus e mesa de bar. Este é um assunto de inesgotáveis interpretações, tanto se ouve falar da crise de identidade que de repente você já tá falando sobre isso de novo.

Um dia você acorda e percebe que não é o carrossel que você deseja brincar, aí olha o do vizinho e acha o máximo, se a vida fosse um parque de diversões nos estaríamos neste momento presos eternamente ao bate bate.

Parece complicado mas, começa assim: Você tá feliz e contente, saltitando pela vida e de repente alguém lhe pergunta algo que você nunca pensou a respeito.

– Você é racista?

– Você  acredita em Deus?

– O que você acha dos gays? E das putas?

– Você sabe o mal que a maconha causa?

– Quem torce pro Flamengo é tudo viado, diga aí?

– Menor é tudo marginal, se sabe usar droga, também sabe matar. Concorda?

– Sabia que ela tem AIDS?

– Seus pais são casados?No civil e no religioso?

– Ele é adotado, sabia?

– Nordestino é tudo ignorante, né não?

 

Eu poderia ter duas páginas com esse tipo de questionamento, o maior problema é achar que precisamos ter opinião sobre tudo. Desta forma, sempre iniciar uma discussão com intuito apenas de ter a razão.

Entenda, a crise financeira é permanente, mas a crise de identidade pode ter fim, basta aceitar que não sabe de tudo e nem precisa ter opinião pra qualquer assunto.

Nossa sociedade está sendo reformulada, e isso é bom e ruim.

Para uma convivência pacífica, aceite, respeite e inspire. O resto, releve.

 

Namastê